Há muito eu pensava em escrever sobre a experiência de ter 23 anos. A idade em si não teria nada de mais, não fosse por algumas coincidências que eu fui encontrando por aí, entre um filme e outro e a vida real. No fim, os 23 acabam dizendo muito mais sobre mim mesma do que qualquer outra idade já poderia ter dito.
Em "Antes do amanhecer", Celine (Julie Delpy) tem 23 anos e é estudante da Sorbonne. Não trabalha, não sabe o que fazer da vida e passa férias viajando de trem pela Europa. Quando assisti ao filme, a primeira coisa que pensei foi: ou eu supero a Celine aos 23 com emprego e estabilidade ou eu justifico a minha confusão tendo a personagem como exemplo. "Se a Celine, que é tão incrível e inteligente não sabe o que fazer da vida, eu também não preciso saber". E não me culpo por levar em consideração uma pessoa que não existe. A arte não serve para experimentar o que não é real?
Acabou que com a idade da Celine eu tenho o emprego legal, passei da faculdade para a pós-graduação, mas não tenho estabilidade nem as férias de trem pela Europa. O que ela pensaria se pudesse me ver agora?
Mas a que mais faz com que eu questione a minha realidade é a Natalie Keener de "Amor sem escalas". Pausa para dar os parabéns a Anna Kendrick pelo papel que a fez dar adeus aos filmes adolescentes e estúpidos, tipo Crepúsculo, sabe? Não há nada que eu deteste mais do que um vampiro. Na verdade há sim: um vampiro adolescente com pó de arroz.
Mas voltando ao assunto. No filme, a Natalie se forma com louvor na faculdade, mas se muda para uma cidade "nada a ver" com o namorado que, eventualmente, termina com ela. Enquanto Natalie achava que fazia a coisa certa, trabalhava demitindo pessoas com o George Clooney, que não vem ao caso. Ela queria a família e a carreira. Nem uma das duas aconteceu na hora esperada.
Acho que aos 23, a Rory de Gilmore Girls se formou em Jornalismo e foi trabalhar na campanha de um certo senador de Illinois que queria se candidatar à presidência. Como é o nome dele mesmo? Ah! Barack Obama. Fico pensando se a Rory estaria em Washington agora organizando as coletivas de imprensa... Aos 23 ela não tinha a menor ideia de que daria certo.
Nem poderia ter. Com essa idade, o mundo nunca ficou com um ponto de interrogação tão grande. Eis o que os anos me disseram:
Aos 23, você fica em dúvida se trabalha feito uma maluca ou se equilibra o tempo com mais estudo. Certamente, você vai querer viajar e a escolha tem de tudo para ser um mochilão pela América Latina. Nada pode ser mais óbvio do que isso. Você pode querer morar sozinha, mas vai precisar da ajuda dos pais para encontrar e organizar os móveis... e a vida. Eles também vão te ajudar a pagar o aluguel. Não se engane. Aos 23, ningúem é independente. Você vai pensar que da sua idade seus pais já estariam casados ou pagando a festa de casamento das irmãs. Morando sozinha aos 23, você vai certamente ter superado qualquer desavença juvenil em relação aos seus pais. É a melhor fase, quando família vira amizade também.
É provável que você queira se casar aos 23, mas recusaria a proposta por um emprego incrível em São Paulo, Nova York, Tel Aviv ou qualquer outra cidade interessante. Nessa fase, você vai voltar a acreditar que casamento é amor. Antes, você pensava que era um contrato, porque fazia mais sentido. Jovem de esquerda que foi, como todas. Você pode descobrir que parar de pensar em casamento é salvar o namoro.
Muito importante: você vai ter certeza de que escreve mal e de que nada no mundo vai resolver o problema. Ou você nasce para trabalhar na The Economist ou deixa de lado a pretensão. É o tipo de coisa que não se aprende.
Aos 23, sua amiga solteira convicta vai começar a namorar sério, muito sério. Você vai ter a sensação de que o mundo está entrando em uma nova era. Sua prima de 23 acaba de entrar na faculdade de Cinema. Seu apartamento é o melhor lugar para se viver.
Com 23 anos, você nunca esteve tão velha e tão jovem ao mesmo tempo. Nada é "preto no branco" aos 23 e talvez nunca mais seja. Finalmente, você vai parar de buscar respostas para tudo nessa vida e vai aceitar o que é apenas mistério, fé ou gente que nunca vai gostar de você. Você vai até tirar o "apenas" dessa frase. Pela primeira vez, você vai achar a sua vida mais interessante do que uma série de TV.